INSCRIÇÃO: | 01590 |
CATEGORIA: | PT |
MODALIDADE: | PT11 |
TÍTULO: | Além dos Muros |
AUTORES: | Carlos Eduardo Pereira Freitas (Universidade Federal do Ceará); Marcelo Andrey Monteiro de Queiroz (Universidade Federal do Ceará); Filipe Pereira da Silva (Universidade Federal do Ceará); Iury Figueiredo Campos (Universidade Federal do Ceará); Larissa Pereira dos Santos (Universidade Federal do Ceará); Ana Beatriz Leite de Souza (Universidade Federal do Ceará); Naiana Rodrigues da Silva (Universidade Federal do Ceará) |
PALAVRAS-CHAVE: | transmídia, multimídia, website, documentário híbrido, intervenção urbana |
RESUMO | |
O projeto transmídia Além dos Muros objetiva discutir as relações entre medo e destemor no meio urbano da cidade de Fortaleza. A partir das narrativas em diferentes plataformas, histórias de temor e resistência na vida citadina são contadas de forma complementar, como preconizado nos conceitos dispostos por Jenkins (2009) e Salaverría (2010) acerca da transmidialidade e da multimidialidade. A produção é narrada por meio de um website, que dá nome ao projeto; um documentário híbrido (MACHADO, 2011), intitulado Papel Filme; além de intervenção urbana e criação de peças para redes sociais; estas duas últimas pensadas com base no conceito de espalhamento (JENKINS, 2009). | |
INTRODUÇÃO | |
O sexto semestre do curso de jornalismo da Universidade Federal do Ceará tem na sua grade disciplinas laboratoriais relativas às mídias utilizadas pela profissão atualmente. Ainda que as redações e a função do jornalista estejam mais vinculadas à ideia multiplataforma defendida e propiciada pela noção de convergência (JENKINS , 2009), os estudantes escolhem um laboratório dentre telejornalismo, jornalismo multimídia, jornalismo impresso e radiojornalismo para atuar. Pensando nessa forma de trabalho e considerando as funções do jornalista contemporâneo, os professores das disciplinas de telejornalismo e jornalismo multimídia optaram por unir os projetos pedagógicos e propor aos estudantes a produção de um material transmídia. A ideia inicial seria a formulação de um projeto que pudesse ser publicado separadamente, mas de forma complementar, a ponto de propiciar uma leitura narrativa em diferentes plataformas. À vista da escolha do formato, os estudantes passaram a pensar na temática a ser abordada no especial transmídia, que deveria ser grande o suficiente para ser discorrida em diversas plataformas e, ao mesmo tempo, não se tornar vaga. Com a apresentação de pautas propostas pelos alunos do laboratório, após votação, foi escolhido o tema relacionado à segurança pública, porém, apenas como ponto de partida, pois o grupo considerou a existência de um fio capaz de conectar as narrativas multiplataforma: o medo. Dessa forma, a temática passou da concretude social (segurança pública) para a abstração social (medo), esta sendo considerada como critério de noticiabilidade básico e princípio narrativo para a produção transmídia. Entretanto, em decorrência da responsabilidade social da discussão, foi ponderada a necessidade de trazer para o debate não só as questões que circundam o medo urbano, mas também as formas encontradas pelos citadinos de resistência às intempéries da cidade. | |
OBJETIVO | |
A produção Além dos Muros tem como objetivo principal proporcionar uma leitura pormenorizada sobre os medos relativos à vida do cidadão de Fortaleza e, consequentemente, as diversas formas de resistência frente à essas adversidades. Apesar disso, cada produto do material transmídia possui objetivos específicos, sendo, assim, um grande mosaico de discussão acerca da temática. Através do conceito de jornalismo longform (LONGHI & WINQUES, 2015), o website objetiva contar histórias de pessoas que vivem a cidade e compartilham o medo social que permeia o imaginário do citadino. As narrativas dispostas nas abas digitais são compostas tanto por essas pessoas, que possuem esses receios, como por aquelas que os provocam - tentando, dessa forma, desmistificar possíveis estereótipos construídos socialmente. Tendo como base o conceito de medo líquido (BAUMAN, 2009), o documentário híbrido, por sua vez, intenta discutir narrativas de pessoas comuns entrevistadas na cidade a partir de uma relação entre real e ficcional. A proposta do documentário é destrinchar os medos mais remotos e sensíveis da população urbana, que tende a construir e reconstruir medos sociais de acordo com as relações interpessoais na sociedade contemporânea. A intervenção urbana almeja levar a discussão propiciada através do produto transmídia para onde ela foi recortada: a cidade. A ação pretende provocar interação dos transeuntes com os lambe-lambes, dispostos em locais específicos, a fim de torná-los atores do processo de resistência do medo social, ajudando e sugerindo formas de agir na cidade frente ao temor. Por fim, as peças para redes sociais visam atingir o público levando-o para os demais materiais da narrativa transmídia, bem como mostrar histórias de pessoas que resistem aos medos urbanos descobertos através da produção. | |
JUSTIFICATIVA | |
Com a crescente relevância da temática da violência urbana na discussão social e midiática, tornou-se necessário que o debate acerca desse assunto não se resumisse apenas a casos violentos, já tratados diariamente por programas policialescos e jornais diários na cidade de Fortaleza. Como responsabilidade social do jornalista, tornou-se necessário partir para a discussão de assuntos relativos à própria violência, mas que apontem para a raiz do problema ou para a consequência que aquela causa, tudo isso emoldurado pelos medos cotidianos compartilhados socialmente. Apesar de o espaço geográfico do projeto se referir ao município de Fortaleza, descobriu-se durante a produção do material que os medos são inerentes ao morador de qualquer centro urbano, ou seja, ainda que as narrativas sejam compostas por moradores da capital cearense, é possível encontrar receios similares entre eles e qualquer outro citadino. Essa característica presente na sociedade contemporânea, no entanto, não se apresenta da mesma forma quando colocada em tom de igualdade aos demais períodos históricos. Ao passo que as sociedades foram se modificando com o tempo, os medos também seguiram o caminho da história. De acordo com Barreira (2011), o que causava temor nas sociedades medievais, como bruxas e duendes, hoje em dia não encontra tanto respaldo no imaginário urbano . Segundo a autora, o medo “se reproduz em larga escala e em cadeia, tornando-se um sentimento partilhado por todos e integrando aquilo que poderia ser nomeado como inconsciente coletivo” (BARREIRA, 2011). Para a autora, a cidade reforça a ideia de segregação e intolerância, transparecendo que a vida urbana é mais propensa ao risco. Dessa forma, o medo social se expande e, como preconizado, se espalha de uma forma avassaladora, provocando um distanciamento entre “o sentimento de desproteção do cidadão urbano e a crença na eficácia das instituições de controle social” (BARREIRA, 2011). Entretanto, a discussão acerca do fortalecimento desses medos urbanos não se resume apenas à real desproteção das pessoas por parte do Estado, mas a uma superexposição aos discursos midiáticos de periódicos, jornais televisivos e programas policialescos, veiculados nos meios de comunicação de massa. Barreira (2011) reforça a noção caracterizada por Adorno (2006) de que a mídia atua como um veículo de ressonância social: “embora reconhecendo que os meios de comunicação, evidentemente, não inventam fatos, contribuem para a exacerbação da violência, a partir da própria competição de emissoras pela apresentação de reportagens contendo crimes e fatos de impacto emocional” (BARREIRA, 2011). As ponderações da autora com relação ao papel da mídia na dissipação do medo social convergem com o que é defendido por Kellner (2001) no tocante à funcionalidade desses meios de comunicação de massa. De acordo com o autor, "numa cultura contemporânea dominada pela mídia, os meios dominantes de informação e entretenimento são uma fonte profunda e muitas vezes não percebidas de pedagogia cultural: contribuem para nos ensinar como nos comportar e o que pensar e sentir, em que acreditar, o que temer e desejar – e o que não" (KELLNER, 2001, p.10). A partir da leitura de Kellner (2001), é possível inferir que os programas de cunho violento, veiculados na grande mídia, podem propiciar uma cultura do medo, capaz de atingir o citadino. Entretanto, de forma geral, a imprensa não se preocupa com essa disseminação da informação, pois o lucro está vinculado ao caráter da notícia. De acordo com Oliveira (2005 apud KOGUT & SILVA, 2008, p. 278), “quanto mais ‘apelativa’ a matéria veiculada, maiores têm sido as chances de que isto se reverta em incremento de audiência e do patrocínio”, pois a imprensa, embora seja um importante pilar da democracia, nem sempre busca diminuir o medo social. | |
MÉTODOS E TÉCNICAS UTILIZADOS | |
Antes do início da produção do projeto transmídia Além dos Muros, as disciplinas laboratoriais de Jornalismo Multimídia e Telejornalismo foram espaço para discussões teóricas na intenção de embasar os estudantes sobre o formato do material que seria feito e as características inerentes a ele. Portanto, é necessário que se apresente, inicialmente, as noções de convergência e multimidialidade - norteadoras do processo produtivo - para que, a narrativa transmídia seja discorrida de forma coesa. Por razão de existência, não se pode debater qualquer relação entre mídias através de narrativas ou tecnologias sem pensar no conceito base do jornalismo digital: a convergência. Para tanto, o primeiro passo para a formalização desse processo é que haja convergência tecnológica, pois ela permite que os conteúdos digitais possam ser distribuídos nas diferentes plataformas (MASIP Y MICÓ, 2009, tradução nossa). Com a permissividade tecnológica, é possível que haja o que Salaverría (2010) classifica como convergência jornalística. Segundo o autor, o processo modifica os âmbitos profissionais e editoriais dos meios de comunicação, “propiciando uma integração de ferramentas, espaços, métodos de trabalho e linguagens anteriormente desregrados, de forma que os jornalistas elaboram conteúdos que se distribuem através de múltiplas plataformas, mediante linguagens próprias de cada uma” (SALAVERRÍA, 2010, p. 59, tradução nossa). De acordo com Jenkins (2009), a convergência pode ser lida como um fluxo de conteúdos possibilitados através de diferentes suportes midiáticos, que estariam vinculados, da mesma forma, a múltiplos mercados e ao comportamento dos consumidores, que tendem a ser migratórios em decorrência das diversas possibilidades propostas. No entanto, esse rol de viabilidades acaba por proporcionar também uma gama de formas diferenciadas de narrativas convergentes, possibilitando, por exemplo, a multimidialidade e a transmidialidade. Segundo Palacios (2002), a multimidialidade refere-se à narração do fato jornalístico a partir da convergência entre os formatos das mídias tradicionais. Indo além da conceituação de Palacios, Jenkins (2010) diferencia multimídia de transmídia, consideradas por ele como duas lógicas ligadas à convergência. Segundo o autor, a lógica multimídia diz respeito à concentração ou à justaposição de conteúdos, enquanto a lógica transmídia se reverbera na fragmentação, expansão ou dispersão: "em relação à narrativa, a lógica multimídia simboliza a concentração da história, com o uso de diferentes códigos (linguístico, textual e sonoro), em uma única plataforma. Já a narrativa transmídia compreende o uso de várias plataformas de mídias, de modo a expandir a história e a enriquecer a experiência" (JENKINS, 2010, p. 61). Entretanto, apesar de as duas lógicas caracterizarem processos diferenciados de operação, segundo Jenkins (2010), elas podem coexistir e ser combinadas em determinadas situações. O projeto Além dos Muros opera nesse limiar destacado pelo autor, onde há um ponto de cruzamento entre a transmídia e a multimídia, propiciadas em diferentes suportes de conteúdo, permitindo circulação do fluxo de informação e a complementaridade transmidiática. Assim, o projeto Além dos Muros apresenta maior capacidade multimídia no website, principal produto de informação, em que diversas mídias são utilizadas para construção das narrativas, como texto, vídeo, imagem, infográficos, fotonovela, audiodramatização, etc. Enquanto a transmídia é propiciada por meio da existência das demais produções, complementando a narrativa primária em outras mídias, como o documentário híbrido Papel Filme, a intervenção urbana e as peças para redes sociais. A essa altura, Jenkins (2009) já assinalava o conceito de transmídia, norteador do produto por completo. Segundo ele, “uma história transmidiática se desenrola através de múltiplos suportes midiáticos, com cada novo texto contribuindo de maneira distinta e valiosa para o todo. Na forma ideal de narrativa transmidiática, cada meio faz o que faz de melhor” (JENKINS, 2009, p. 135). Pernisa Júnior (2010, p. 3 apud ALZAMORA E TARCIA, 2012, p. 26) complementa o conceito sugerido por Jenkins ao dizer que as plataformas são utilizadas de “forma inteligente” e sincronizadas para não caírem na redundância de conteúdo. Por isso, durante a produção de um material transmídia, são elencadas as plataformas que terão caráter primário e secundário de informação - esta também classificada por Jenkins (2008) como extensões midiáticas. De acordo com Souza (2011, p. 54), ambos os elementos podem ser publicados em conjunto ou em intervalos entre um produto e outro, na intenção de captar a atenção do consumidor com a narrativa. Segundo Souza (2011, p.55), a partir da leitura de Long (2007), existe uma interação entre os suportes quando lançados de forma conjunta ou separada. De acordo com o autor, quando os produtos são publicados de forma concomitante e planejada, as narrativas transmídia são fortes, pois há uma intenção prévia; porém, são consideradas fracas quando “os elementos secundários são apresentados após o sucesso reconhecido do elemento principal, isto é, a narrativa se amplia e se torna transmídia em função do retorno financeiro e da identificação do público com o universo ficcional” (SOUZA, 2011, p. 55). No entanto, para que possa existir uma experiência transmidiática real sem sobreposição e repetição de informações, Souza (2011) aponta que a narrativa transmídia necessita de um universo ficcional enciclopédico (JENKINS, 2009), o que permitiria que diversas histórias fossem contadas em plataformas diferentes e, consequentemente, favoreceria a dispersão de informação. Além disso, para reunir os fragmentos dessas histórias dispersas e conectar as plataformas, os produtores de conteúdo deveriam fazer o que Jenkins (2009) conceitua como pontes de entrada, cuja função seria assumir o papel de conexão para o mundo da história (SOUZA, 2011, p. 55). Com base nas conceituações supracitadas relativas à convergência, multimídia e transmídia, foi construído o especial Além dos Muros, produto elaborado por estudantes do curso de jornalismo da Universidade Federal do Ceará dentro das disciplinas laboratoriais de jornalismo multimídia e telejornalismo. O projeto Além dos Muros compreende um website, que dá nome à produção; o documentário híbrido Papel Filme; a intervenção urbana “O medo constrói muros. Mas podemos derrubá-los”; e a criação de peças para redes sociais. Como dito acerca da característica multimidiática e transmidiática do projeto Além dos Muros, há um ponto de cruzamento entre as narrativas. Enquanto o website possui maior capacidade de narratividade multimídia, por causa dos diversos formatos e linguagens utilizados nas suas abas, quando há a inserção do documentário, da intervenção e das peças para redes sociais, a capacidade transmidiática transparece, formando, assim, o especial como ele foi pensado e executado. | |
DESCRIÇÃO DO PRODUTO OU PROCESSO | |
Pensado como produto principal do projeto transmídia, o website Além dos Muros se configura como uma produção de caráter primário de informação, ou seja, é a partir da sua narrativa que o projeto começou a ser formulado e pelo qual foi elaborado. O website foi construído a partir de uma conceituação baseada no jornalismo longform, considerado como “1) um nível mais aprofundado de relato, que vai além do padrão cotidiano da produção (jornalística) e 2) narrativas atraentes, frequentemente com elementos multimídia, que realçam o artigo” (FISHER, 2013 apud LONGHI & WINQUES, 2015, p. 112). De acordo com as autoras, a narrativa longform aparece como contraponto ao que é praticado comumente no webjornalismo, ganhando espaço nas grandes reportagens multimídia graças à popularização dos dispositivos móveis, que permitem facilidade de leitura e portabilidade. A característica “longa” desse tipo de narrativa, segundo as autoras, não se resume apenas à profundidade dos textos, mas também “à extensão de tempo empregado em apurar, redigir, editar e então apresentar ao leitor” (STOUT; FISCHER, 2013 apud LONGHI & WINQUES, 2015, p. 113). Partindo desses preceitos de jornalismo longform e da capacidade multimidiática possibilitada pelo webjornalismo, foi construído o website “Além dos Muros: narrativas de medo e resistência na vida urbana”. As abas principais foram divididas entre as seis grandes reportagens, que possuem temas específicos relativos ao medo e ao destemor de pessoas na cidade de Fortaleza; além delas, houve ainda uma área específica para o editorial em vídeo, outra para o documentário híbrido Papel Filme e uma última para os créditos do especial. A primeira narrativa disposta no website, intitulada “Caminhos para o mar”, leva o leitor a percorrer pontos específicos da cidade de Fortaleza, apresentando texto, fotografias dos locais e dos entrevistados, galerias de imagens e story maps, que levam o leitor a passear pela história daqueles locais. “Vias de pânico”, por sua vez, se constrói a partir de uma fotonovela que discute os medos enfrentados pelos fortalezenses no transporte público, a narrativa visual se alia a textos e vídeos como potencial multimídia. “Entre Noites” é uma outra narrativa contada através da história de pessoas que trabalham durante a noite em um local de grande circulação da cidade de Fortaleza; a narrativa é contada através de galeria de imagens e entrevistas em áudio. A reportagem “As grades guardam medos” foca na ressocialização de ex-presidiários do sistema penitenciário cearense e como eles encontraram formas diversas de viver na sociedade, com histórias narradas através de texto e imagens. A narrativa “As duas cores da sirene” tenta desvendar histórias de medo e violência relacionadas à atuação das forças de segurança em Fortaleza; são utilizados texto, infográfico, fotografia, audiodramatização e entrevistas em áudio para composição da narrativa. Já a reportagem “O medo do outro” conta histórias de pessoas dentro de estereótipos consideradas pelos fortalezenses como “que causam medo”; a narrativa é construída por meio de texto, fotografia, vídeo, infografia, história em quadrinhos e ilustração. O documentário híbrido Papel Filme foi a principal estratégia elaborada pelo grupo para que a transmidialidade pudesse ser experimentada. Publicados de forma concomitante, a narrativa transmídia dos dois produtos se configura, de acordo as leituras de Souza (2011), como fortes e de caráter primário, por causa do planejamento pensado para suas veiculações e a sua relação através da ponte de entrada (JENKINS, 2009) disponível no website por meio de uma aba específica. Baseado na obra “O medo líquido”, do sociólogo polonês Zygmunt Bauman, a narrativa audiovisual é contada a partir de histórias de pessoas entrevistadas por estudantes do laboratório. Os relatos foram transpostos para um roteiro, cuja função era ser interpretado por dois atores e duas atrizes, diferentes entre si, tentando, dessa forma, generalizar os medos relatados, comuns a muitos seres humanos. Essa relação entre ficcional e real é o que caracteriza o documentário híbrido (chamado anteriormente de docudrama), segundo Arlindo Machado (2011). De acordo com o autor, o documentário híbrido está entre o documento e a imaginação, "pois, a bem da verdade, nenhum documentário é realmente um documentário puro. Aliás, um documentário puro seria algo inimaginável, pois sempre há a interposição da subjetividade de um (ou mais) realizador(es), sempre são feitas escolhas, seleções, recortes e é inevitável que essas mediações funcionem como interpretações. Para o bem ou para o mal. Na verdade, o documentário puro nem é desejável, pois seria algo insípido, incolor e inodoro, além de inútil" (MACHADO, 2011, p. 10). Uma das referências para o Papel Filme foi o que Machado (2011) considera como a maior representação do documentário híbrido brasileiro, a produção Jogo de Cena (2006), de Eduardo Coutinho. Na obra do diretor, foram entrevistadas diversas mulheres e algumas delas gravadas, posteriormente, atrizes são incrementadas nas narrativas contando as mesmas histórias, o que impossibilita o discernimento do espectador acerca da realidade e da ficção. O Papel Filme inicia a partir de interpretações de excertos da obra “O medo líquido” pelos atores e atrizes convidados para participarem da gravação. Posteriormente, eles são impelidos a contar suas histórias, transparecendo, inicialmente, que são seres incapazes de sentir medo, mas logo cedem à realidade quando acontecem alguns fatos que interferem nos seus espaços e na naturalidade dos seus discursos. A intervenção urbana “O medo constrói muros. Mas podemos derrubá-los” e as peças produzidas para as redes sociais se apresentam dentro do material transmídia, de acordo com os preceitos defendidos por Souza (2011), como de caráter secundário, tendo em vista que foram produzidas após o fechamento da transmidialidade primária (entre website e documentário). Vistos como uma extensão do website, a intervenção e as peças para redes sociais foram pensadas tendo como pressuposto o princípio de espalhamento da transmídia, conceituado por Jenkins (2009) como “a capacidade do público de participar ativamente na circulação de conteúdo de mídia através de redes sociais e na expansão de seus valores econômico e cultural” (JENKINS, 2009 apud MARTINS & LONGHI, 2015, p. 6). Complementando a leitura de Jenkins (2009) acerca do assunto, Souza (2011) infere que o espalhamento está ligado ao processo de transmidiação. Segundo o autor, “o espalhamento no jornalismo compreende o uso de ferramentas de recomendação, valoração, compartilhamento e comentários dentro dos sites jornalísticos e a utilização das redes sociais com finalidade semelhante” (SOUZA, 2011, p. 149). As peças publicadas nas redes sociais foram feitas com base nas histórias de entrevistados do website, que tiveram intervenções visuais (pontes de entrada) demarcadas em suas imagens com a intenção de remeter à identidade visual do site e aos discursos tratados no suporte descrito. O mesmo ocorreu com as peças produzidas para capa de perfis no Facebook (anexo 1), pois a identidade visual pertencente ao Além dos Muros se manteve nesse material que, inclusive, dava nome a outro segmento transmidiático, a intervenção urbana, possibilitando assim mais uma ponte de entrada entre os suportes. Dessa forma, a relação entre redes sociais e produtos audiovisual e digital proporcionaram o fortalecimento da figura do prosumidor, termo cunhado por Alvin Toffler, no livro “A Terceira Onda” (1980), para caracterizar o consumidor que produz conteúdo, contribuindo no processo de transmidiação. O papel do prosumidor encontra na intervenção urbana do especial Além dos Muros (anexo 2) uma forma de atuação, pois ele é convidado a interagir com os lambe-lambes sugerindo formas de lidar com o medo na cidade através de outra ponte de entrada, a ferramenta qrcode, que leva o prosumidor da intervenção ao website. | |
CONSIDERAÇÕES | |
Considerando a relevância social do assunto tratado no especial transmídia Além dos Muros no que diz respeito ao medo e às formas de resistência discorridos durante a narrativa, o processo de produção foi genuinamente importante para a formação dos estudantes do sexto semestre, no período 2016.1, do curso de jornalismo da Universidade Federal do Ceará. O caráter multimidiático proposto no website Além dos Muros proporciona aos estudantes versatilidade no que diz respeito à diversidade de formatos utilizados nas narrativas, levando em consideração que foram pensados para construção: texto, fotografias, vídeos, fotonovela, audiodramatização, história em quadrinho, etc. Além de experimentar os debates acerca da temática, que requer um tratamento pautado na responsabilidade social da profissão e no cuidado no tocante à divulgação das fontes, por muitas delas estarem em vulnerabilidade social, os estudantes puderam exercitar características do jornalismo transmídia e multimídia. Através da correlação das narrativas, a transmidialidade proporcionou aprendizados que saíram da própria profissão e flertaram com a arte urbana e com a gestão de redes sociais, favorecendo a construção de um trabalho transdisciplinar. | |
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁICAS | |
BARREIRA, I. A. F. A cidade e o medo In: BARREIRA, C.; BATISTA, J. É. (Org.) . (In) Segurança e Sociedade: treze lições. 1. ed. Campinas; Fortaleza: Pontes; Fundação Demócrito Rocha, 2011. v. 1. p.87-103. BAUMAN, Zygmunt. Confiança e medo na cidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2009. JENKINS, Henry. Cultura da Convergência. 2. ed. São Paulo: Aleph, 2009 JENKINS, Henry. Transmedia Storytelling: moving characters from books to filmes to video games can make them stronger and more compelling. 2003. Disponível em: JENKINS, Henry. Transmedia education: the seven principles revisited, 2010. Disponível攀洀㨀 㰀栀琀琀瀀㨀⼀⼀琀椀渀礀甀爀氀⸀挀漀洀⼀㈀搀挀㘀欀砀瘀㸀⸀ 䄀挀攀猀猀漀 攀洀㨀 ㈀ 洀愀椀⸀ ㈀ 㜀⸀㰀戀爀㸀㰀戀爀㸀䬀䔀䰀䰀一䔀刀Ⰰ 䐀漀甀最氀愀猀⸀ 䄀 挀甀氀琀甀爀愀 搀愀 洀搀椀愀㨀 䔀猀琀甀搀漀猀 挀甀氀琀甀爀愀椀猀㨀 椀搀攀渀琀椀搀愀搀攀 攀 瀀漀氀琀椀挀愀 攀渀琀爀攀 漀 洀漀搀攀爀渀漀 攀 漀 瀀猀ⴀ洀漀搀攀爀渀漀⸀ 吀爀愀搀甀漀 搀攀 䤀瘀漀渀攀 䌀愀猀琀椀氀栀漀 䈀攀渀攀搀攀琀琀椀⸀ 䈀愀甀爀甀Ⰰ 匀倀㨀 䔀䐀唀匀䌀Ⰰ ㈀ ⸀㰀戀爀㸀㰀戀爀㸀䬀伀䜀唀吀Ⰰ 䌀⸀ 嘀⸀㬀 匀䤀䰀嘀䄀Ⰰ 圀⸀ 刀⸀ 䄀 洀搀椀愀 攀 猀攀甀猀 攀昀攀椀琀漀猀 猀漀戀爀攀 漀 洀攀搀漀 猀漀挀椀愀氀 䤀渀㨀 倀䔀䤀堀䔀Ⰰ 䈀⸀ 䌀⸀ 匀⸀㬀 䠀䤀䰀䜀䔀䴀䈀䔀刀䜀Ⰰ 䌀⸀ 䴀⸀ 䄀⸀ 吀㬀 䴀䔀䰀䄀吀吀䤀Ⰰ 䜀⸀ 䄀⸀㬀 䈀䔀刀吀伀䰀䤀一䤀Ⰰ 䜀⸀ 刀⸀ 䘀⸀㬀 䴀䄀䌀䠀䄀䐀伀Ⰰ 䠀㬀 倀㬀 嘀⸀ 䜀攀猀琀漀 搀攀 倀漀氀琀椀挀愀猀 倀切戀氀椀挀愀猀 渀漀 倀愀爀愀渀㨀 䌀漀氀攀琀渀攀愀 搀攀 䔀猀琀甀搀漀猀⸀ 䌀甀爀椀琀椀戀愀㨀 䔀搀椀琀漀爀愀 倀爀漀最爀攀猀猀椀瘀愀Ⰰ ㈀ 㠀⸀ 嘀漀氀⸀ ⸀ 倀⸀㈀㜀㜀ⴀ㈀㠀㜀⸀㰀戀爀㸀㰀戀爀㸀䰀伀一䜀䠀䤀Ⰰ 刀愀焀甀攀氀㬀 圀䤀一儀唀䔀匀Ⰰ 䬀爀氀攀礀⸀ 伀 氀甀最愀爀 氀漀渀最昀漀爀洀 渀漀 樀漀爀渀愀氀椀猀洀漀 漀渀氀椀渀攀㨀 焀甀愀氀椀搀愀搀攀 瘀攀爀猀甀猀 焀甀愀渀琀椀搀愀搀攀 攀 愀氀最甀洀愀猀 挀漀渀猀椀搀攀爀愀攀猀 猀漀戀爀攀 挀漀渀猀甀洀漀⸀ 䈀爀愀稀椀氀椀愀渀 䨀漀甀爀渀愀氀椀猀洀 刀攀猀攀愀爀挀栀Ⰰ 嬀猀⸀氀崀Ⰰ 瘀⸀ Ⰰ 渀⸀ Ⰰ 瀀⸀ ⴀ㈀㜀⸀ ㈀ 㔀⸀㰀戀爀㸀㰀戀爀㸀䴀䄀䌀䠀䄀䐀伀Ⰰ 䄀爀氀椀渀搀漀⸀ 一漀瘀漀猀 琀攀爀爀椀琀爀椀漀猀 搀漀 搀漀挀甀洀攀渀琀爀椀漀⸀ 瘀⸀ ⸀ 搀攀稀 ㈀ ⸀ 䐀椀猀瀀漀渀瘀攀氀 攀洀㨀 㰀栀琀琀瀀㨀⼀⼀眀眀眀⸀搀漀挀⸀甀戀椀⸀瀀琀⼀⼀搀漀猀猀椀攀爀开愀爀氀椀渀搀漀开洀愀挀栀愀搀漀⸀瀀搀昀㸀⸀ 䄀挀攀猀猀漀 攀洀㨀 ㈀ 洀愀椀 ㈀ 㜀⸀㰀戀爀㸀㰀戀爀㸀䴀䄀刀吀䤀一匀Ⰰ 䔀氀愀椀渀攀㬀 䰀伀一䜀䠀䤀Ⰰ 刀愀焀甀攀氀⸀ 吀爀愀渀猀洀搀椀愀Ⰰ 挀爀漀猀猀洀搀椀愀 攀 椀渀琀攀爀洀搀椀愀 渀愀 最爀愀渀搀攀 爀攀瀀漀爀琀愀最攀洀 洀甀氀琀椀洀搀椀愀⸀ 唀洀 攀猀琀甀搀漀 搀愀猀 攀猀琀爀愀琀最椀愀猀 渀愀爀爀愀琀椀瘀愀猀 渀愀 猀爀椀攀 吀甀搀漀 匀漀戀爀攀Ⰰ 搀愀 䘀漀氀栀愀 搀攀 匀⸀ 倀愀甀氀漀⸀ 䤀渀㨀 䔀一䌀伀一吀刀伀 䐀䔀 倀䔀匀儀唀䤀匀䄀䐀伀刀䔀匀 䔀䴀 䨀伀刀一䄀䰀䤀匀䴀伀㨀 倀䔀匀儀唀䤀匀䄀 䔀䴀 䨀伀刀一䄀䰀䤀匀䴀伀 䔀 刀䔀䌀伀一䘀䤀䜀唀刀䄀윀쌀伀 䐀䔀 䘀刀伀一吀䔀䤀刀䄀匀Ⰰ ㌀⸀Ⰰ ㈀ 㔀Ⰰ 䌀愀洀瀀漀 䜀爀愀渀搀攀⸀ 䄀渀愀椀猀☀†䌀愀洀瀀漀 䜀爀愀渀搀攀㨀 匀䈀倀䨀伀刀Ⰰ ㈀ 㔀⸀㰀戀爀㸀㰀戀爀㸀䴀䄀匀䤀倀Ⰰ 倀攀爀攀㬀 䴀䤀䌀팀Ⰰ 䨀漀猀攀瀀 䰀甀椀猀⸀ 䔀氀 瀀攀爀椀漀搀椀猀琀愀 瀀漀氀椀瘀愀氀攀渀琀 攀渀 攀氀 洀愀爀挀 搀攀 氀愀 挀漀渀瘀攀爀最攀渀挀椀愀 攀洀瀀爀攀猀愀爀椀愀氀⸀ 儀甀愀搀攀爀渀猀 搀攀氀 䌀䄀䌀Ⰰ ㈀ 㤀⸀㰀戀爀㸀㰀戀爀㸀倀䄀䤀匀Ⰰ 䨀漀猀 䴀愀挀栀愀搀漀⸀ 䰀甀昀愀ⴀ氀甀昀愀 儀甀漀琀椀搀椀愀渀愀 ⴀ 䔀渀猀愀椀漀猀 猀漀戀爀攀 愀 挀椀搀愀搀攀Ⰰ 挀甀氀琀甀爀愀 攀 瘀椀搀愀 甀爀戀愀渀愀⸀ 䰀椀猀戀漀愀㨀 䤀䌀匀Ⰰ ㈀ ⸀㰀戀爀㸀㰀戀爀㸀倀䄀䰀䄀䌀䤀伀匀Ⰰ 䴀愀爀挀漀猀⸀ 刀甀瀀琀甀爀愀Ⰰ 挀漀渀琀椀渀甀椀搀愀搀攀 攀 瀀漀琀攀渀挀椀愀氀椀稀愀漀 渀漀 樀漀爀渀愀氀椀猀洀漀 漀渀氀椀渀攀㨀 漀 氀甀最愀爀 搀愀 洀攀洀爀椀愀⸀ 䤀渀㨀 䴀䄀䌀䠀䄀䐀伀Ⰰ 䔀氀椀愀猀 ☀ 倀䄀䰀䄀䌀䤀伀匀Ⰰ 䴀愀爀挀漀猀⸀ ⠀伀爀最⤀⸀ 䴀漀搀攀氀漀猀 搀漀 樀漀爀渀愀氀椀猀洀漀 搀椀最椀琀愀氀⸀ 匀愀氀瘀愀搀漀爀㨀 䌀愀氀愀渀搀爀愀Ⰰ ㈀ ㌀⸀ 倀⸀ 㐀ⴀ㌀㘀⸀㰀戀爀㸀㰀戀爀㸀匀䄀䰀䄀嘀䔀刀刀촀䄀Ⰰ 刀愀洀渀⸀ 䄀瀀爀漀砀椀洀愀挀椀渀 愀氀 挀漀渀挀攀瀀琀漀 搀攀 洀甀氀琀椀洀攀搀椀愀 搀攀猀搀攀 氀猀 瀀氀愀渀漀猀 挀漀洀甀渀椀挀愀琀椀瘀漀 攀 椀渀猀琀爀甀洀攀渀琀愀氀⸀ 唀渀椀瘀攀爀猀椀搀愀搀 搀攀 一愀瘀愀爀爀愀Ⰰ ㈀ ⸀㰀戀爀㸀㰀戀爀㸀匀䤀䴀䴀䔀䰀Ⰰ 䜀攀漀爀最⸀ 䄀 䴀攀琀爀瀀漀氀攀 攀 愀 瘀椀搀愀 搀漀 攀猀瀀爀椀琀漀 椀渀 䘀伀刀吀唀一䄀Ⰰ 䌀愀爀氀漀猀 ⠀漀爀最⤀Ⰰ 䌀椀搀愀搀攀Ⰰ 䌀甀氀琀甀爀愀 攀 䜀氀漀戀愀氀椀稀愀漀⸀ 䰀椀猀戀漀愀㨀 䌀攀氀琀愀Ⰰ ㈀ ⸀㰀戀爀㸀㰀戀爀㸀匀伀唀娀䄀Ⰰ 䴀愀甀爀挀椀漀 䐀⸀ 䨀漀爀渀愀氀椀猀洀漀 攀 䌀甀氀琀甀爀愀 搀愀 䌀漀渀瘀攀爀最渀挀椀愀 ጀ†愀 渀愀爀爀愀琀椀瘀愀 琀爀愀渀猀洀搀椀愀 渀愀 挀漀戀攀爀琀甀爀愀 搀漀 挀愀猀漀 挀愀戀氀攀最愀琀攀 渀漀猀 猀椀琀攀猀 䔀氀 倀愀猀 攀 䜀甀愀爀搀椀愀渀⸀ 匀愀渀琀愀 䴀愀爀椀愀ⴀ刀䜀㨀 唀䘀匀䴀Ⰰ ㈀ Ⰰ ㈀㔀㈀ 昀⸀ 䐀椀猀猀攀爀琀愀漀 ⠀䴀攀猀琀爀愀搀漀 攀洀 䌀漀洀甀渀椀挀愀漀⤀⸀㰀戀爀㸀㰀戀爀㸀ऀ㰀⼀琀搀㸀㰀⼀琀爀㸀㰀⼀琀愀戀氀攀㸀㰀⼀戀漀搀礀㸀㰀⼀栀琀洀氀㸀 |