INSCRIÇÃO: 01139
 
CATEGORIA: JO
 
MODALIDADE: JO16
 
TÍTULO: Ê RTÕ PATAXÓ – Minha aldeia é a natureza
 
AUTORES: Carolina do Nascimento Carvalho (Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro); Marina Florentino Mendes (Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro); Larissa Caetano Pereira Guedes (Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro); Jéssica Moreira Antunes (Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro); Maria de Fátima Costa de Oliveira (Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro)
 
PALAVRAS-CHAVE: ALDEIA, CIDADANIA, DOCUMENTÁRIO, INDÍGENA, PATAXÓ
 
RESUMO
"Ê RTÕ PATAXÓ - Minha aldeia é a natureza" é um curta metragem de 25 minutos que tem como premissa principal retratar a vida de uma ocupação indígena: a Aldeia Kanã Pataxi Üi Tanara, localizada na Cachoeira do Iriri, em Paraty. Desde 2016, a terra é habitada por indígenas da etnia Pataxó, que fugindo dos conflitos no Sul da Bahia, foram para o local. Em busca de um olhar mais sensível e empático, o filme é construído a partir de sequências de relatos do dia-a-dia de uma família de moradores, abordando suas motivações na vida, o amor pela cultura e a sua relação com a natureza. Com caráter leve e dinâmico, o filme traz as questões indígenas à tona não através do choque e exposição de sofrimento, mas pela identificação e empatia com a narrativa do povo Pataxó. O filme foi produzido para a disciplina Criação Audiovisual do curso de Jornalismo da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro.
 
INTRODUÇÃO
No estado do Rio de Janeiro, são 15.894 indígenas autodeclarados, aproximadamente 0,1 % da população total do Estado e 1,9% do total de indígenas autodeclarados no Brasil (IBGE, 2010). No total de oito territórios de caráter rural habitados por povos de etnias indígenas dentro da área fluminense, apenas três são homologados oficialmente. Com o aumento da discussão e repercussão de assuntos ligados a minorias nos contextos sociais, como o movimento negro, o feminismo e a comunidade LGBT, a equipe notou que os povos indígenas são um grupo ainda silenciado e invisibilizado por conta de um processo histórico desvantajoso muito agravado. Após a pesquisa sobre o movimento político indígena no Rio de Janeiro, sobretudo na área urbana e também através de trabalhos acadêmicos, foi decidido debater e levantar as pautas dos que estão dentro do movimento para além da perspectiva de vozes legitimadas e de caráter militante. Com isso, a equipe foi apresentada a Aldeia Kanã Pataxi Üi Tanara, uma aldeia ainda não reconhecida pela FUNAI, nem pelo Estado do Rio de Janeiro e o município de Paraty. Nesse contexto, a produção seguiu para mais de 170 km do centro do Rio de Janeiro, mais precisamente 194 km do campus Seropédica, onde fica a Universidade, para poder conhecer e retratar o dia a dia da comunidade, os hábitos dos moradores e a organização de sua vida social e cultural. Sem luz elétrica, água encanada e rede telefônica, a aldeia permanece a reivindicar e conquistar cada vez mais seus direitos essenciais, mas agradece por já ter uma liberdade muito rara à maioria dos indígenas do território nacional: um lugar em que se sentem seguros e podem viver sua cultura de forma ativa. Seus moradores mantém muitos costumes de seus antepassados, desde as plantações no quintal das casas, as construções feitas de barro e bambu, as pinturas corporais com o suco de jenipapo e o treino de esportes característicos, entre outros exemplos presentes no trabalho.
 
OBJETIVO
O objetivo principal do documentário "Ê RTÕ PATAXÓ - Minha aldeia é a natureza" é colocar em pauta as demandas indígenas, sobretudo as da aldeia Pataxó que protagonizou a produção audiovisual. Em um contexto social em que essas demandas são muitas vezes ignoradas pela mídia hegemônica, ou até mesmo deturpadas de acordo com interesses políticos antidemocráticos, a intenção deste trabalho desde o princípio é dar visibilidade ao povo indígena e amplificar a sua voz, em busca de contribuir para o acesso mais igualitário a representatividade. A partir da exibição do cotidiano de uma aldeia indígena e os hábitos desse povo, procura-se criar uma aproximação do telespectador com a cultura nativa e consequentemente o despertar da empatia. Acreditamos que ao conhecer a realidade dos povos originários, a sociedade possa desconstruir a imagem retrógrada do indígena - reforçada pelas mídias tradicionais - e assim, possa ser menos preconceituosa e negligente com as reivindicações dos povos originários. O filme visa também causar a reflexão sobre o estilo de vida urbano e como ele prejudica a saúde mental e física de seus moradores. No entanto, pouco é dito literalmente a esse respeito, a questão é levantada apenas através do olhar para maneiras alternativas de se alimentar, de educar e de viver coletivamente. A família Pataxó fala sobre o seu amor a uma vida mais leve e mais atenta à natureza, sem a inserção completa na lógica do capital.
 
JUSTIFICATIVA
Essa produção se deu a partir de um primeiro contato, em trabalho anterior, com lideranças indígenas que atuavam em regiões urbanas do Rio de Janeiro, em que pautas do movimento indígena foram trabalhadas com foco maior na militância e no movimento político. A partir disso, foi percebida a necessidade de estar em contato também com grupos menos politizados, fora do contexto urbano, para conhecer a cultura indígena em sua essência. Assim, a ideia se ampliou no sentido de ouvir os indígenas mais distantes da militância para dar ouvidos à quem também luta por seus ideais, mas de forma orgânica e diária. A importância desse trabalho se dá pela necessidade da sociedade encarar com mais humanidade seus próprios ancestrais. Mas, além disso, da necessidade de eliminar a intolerância étnica e entender que os indígenas também são cidadãos do contexto atual, com os mesmos direitos que os nossos. Colocar em pauta a rotina de uma aldeia indígena no Rio de Janeiro significa mais do que produzir um documentário, e sim exaltar, promover e reconhecer que os indígenas existem, resistem e também caminharam ao longo do tempo, em uma trajetória de transformação profunda, ocasionada igualmente pela colonização e pelas imposições sofridas historicamente em processos de apagamento identitário estrutural de sua cultura. Nosso trabalho tem como missão realizar um resgate de fala, de história e ancestralidade, adentrando um campo atualmente desfamiliarizado para colocar em pauta uma discussão que tem urgência em ser ouvida por toda a sociedade.
 
MÉTODOS E TÉCNICAS UTILIZADOS
A eficiência da pré-produção foi possível através dos contatos anteriores com outras lideranças indígenas. Entramos em contato com Arassari Pataxó, estudante de Direito na Estácio, morador da aldeia e um dos líderes do movimento indígena no Rio de Janeiro, que nos ofereceu estadia na aldeia por um fim de semana para que o grupo executasse o trabalho. Com a impossibilidade de escrita, na etapa de pré-produção, não foi possível pensar em um roteiro fechado, muito menos roteirizar cena após cena, já que o nosso tipo de filme não daria conta de uma escolha de abordagem pré-definida (PUCCINI, 2009. p. 177). A partir disso, foi feita a escolha de um roteiro aberto, já que não havia nenhum conhecimento anterior do foco escolhido. As gravações foram feitas de forma intensiva em apenas três dias de imersão antropológica na casa da família Pataxó buscando entender as funções exercidas pelos indígenas com amplas descrições a partir do ponto de vista nativo deles e de seu sistema de conhecimento, culturalidades, crenças, hábitos, pensamentos, organização da vida social, sistema territorial e relações de parentesco e hereditárias que formam a estrutura da sociedade da aldeia. (MALINOWSKI, 1978, págs 6 e 7). Para as gravações cinematográficas, foram utilizadas duas filmadoras Sony Pxw-X70, um tripé e dois microfones de lapelas também da Sony. Foram entrevistados sete moradores, um de cada vez, escolhidos de acordo com a vontade que tinham de participar do projeto e com a finalidade de tornar a narrativa o mais plural possível. As entrevistas foram feitas de forma leve e sem um questionário fixado, na intenção de proporcionar interação entre repórter e fonte e, assim, chegar mais próximo do diálogo interativo e de uma comunicação mais humana e com emoção. (Medina, 2008). Na fotografia das entrevistas foi usado plano médio e para as imagens de apoio plano detalhe, plano geral, close e plano americano. Ilustrando a narrativa, foram gravadas também imagens de rituais, jogos e coisas simples e mais subjetivas do cotidiano: o preparo da comida, o banho de cachoeira, a beleza do ambiente. Na pós-produção, efetuamos a edição dos produtos filmados no programa Sony Vegas, reduzindo um total de três horas aproximadamente de filmagem bruta a 25 minutos no produto final. Nesta edição a narrativa é construída de modo participativo, apenas pelas falas dos entrevistados. Na montagem das entrevistas, foi usado o corte seco para conectar os trechos das falas, com finalidade estética e também ética: A escolha pelo corte seco é uma referência estética a Edifício Master (Eduardo Coutinho, 2002) e carrega as preocupação de manter os cortes da maneira mais visível possível, evidenciando que as partes apresentadas foram escolhidas e recortadas de acordo com a visão e objetivo da equipe de produção e não representam uma verdade total e absoluta sobre a realidade de que se fala. Dessa forma, acreditamos construir um produto mais transparente quanto a nossa parcialidade frente às questões apresentadas.
 
DESCRIÇÃO DO PRODUTO OU PROCESSO
O documentário "Ê Rtõ Pataxó - Minha aldeia é a natureza" é uma produção do curso de jornalismo da UFRRJ e feito para a disciplina Criação Audiovisual, ministrada pela professora Maria de Fátima Costa de Oliveira. Sua edição final tem 25 minutos e conta com depoimentos de sete entrevistados, todos moradores da Aldeia Kanã Pataxi Üi Tanara. A introdução do filme é composta pela apresentação de quatro crianças, onde elas se apresentam dizendo seu nome e o nome de sua aldeia. O subtítulo do filme "Minha Aldeia é a Natureza" é a tradução do nome da aldeia para o português, como explica uma das crianças antes da abertura do filme. "Ê Rtõ Pataxó", por sua vez, significa "Eu sou Pataxó" e permanece na língua patxohã, que é a língua nativa do povo Pataxó. Atualmente, a língua se encontra ameaçada de extinção e passa por um processo de revitalização através do seu ensino dentro das comunidades Pataxós. Dessa forma, o grupo optou pelo nome em patxohã, a fim de reafirmar e valorizar a importância da língua, além de aproximar os personagens do filme. Após a exibição do nome, segue uma sequência de aproximadamente dois minutos composta somente de imagens do cotidiano: duas moradoras conversam na varanda de casa, o avô da família sai arrumado para a cidade, os homens jogam dominó, as mulheres cozinham, o cachorro dorme e a avó arruma a casa. O método é uma tentativa de apresentar ao telespectador os personagens e o cenário de uma forma mais subjetiva, além de expor uma pequena parte da rotina de forma mais intimista. Assim, o que a continuidade utilizada representa em uma produção ficcional, é obtido na produção documental através da história: as situação passam a ser relacionada no tempo e no espaço não por uma montagem previamente roteirizada, mas sim nas ligações reais, históricas e subjetivas. (NICHOLS, 2009. p. 55-56) O entendimento da realidade estrutural e da organização social da vida na tribo Pataxó se deu a partir de uma perspectiva de tempo ecológico, da relação do homem com a natureza e o ambiente que o cerca, uma vez que a dinâmica do tempo em sua sociedade não é substancializada em um segmento abstrato, ele é medido de acordo com as práticas sociais estabelecidas cotidianas com um valor qualitativo e não quantitativo. (E.E. Evans-Pritchard, 1940, pág 116.) Posteriormente, a escolha é de uma sequência de entrevistas e mais cenas cotidianas interligadas de acordo com seu assunto, de forma a compor uma narrativa fluída e leve. As entrevistas são ilustradas com imagens de apoio sem som e estão dispostas na seguinte ordem de aparição ao longo do filme: Hagüi Pataxó, o cacique; Nawã Pataxó, a vice-cacique e agente de saúde indígena da aldeia; Juathy Pataxó, professor de língua e cultura indígena; Auiri Pataxó, aluno do ensino médio e líder do ritual Awê; Tapurumã, artesão e comerciante; Atekäi, dona de casa, e Muriã, mulher mais velha da aldeia, dona de casa e avó da família. Os assuntos tratados no decorrer do filme são às vezes mencionados por mais de um entrevistado, de maneira que suas falas se complementam. São eles em ordem de edição: A história da aldeia: quando, como e porque a ocupação se iniciou; O estilo de vida na aldeia; A educação indígena: o que é, sua importância e seus desafios; A relação cultural com natureza; O artesanato como principal atividade econômica e parte ativa das atividades culturais da Aldeia; A pintura corporal: seus significados e importância cultural; O preconceito sofrido pelo indígena ao ir à cidade; A luta pela saúde indígena; A função do cacique e a importância da luta política por direitos essenciais. Por fim, o filme é concluído com a rolagem de créditos com os nomes de todos que participaram do filme e não somente deram entrevista. Os nomes são divididos entre os núcleos familiares, com a finalidade de aproximar o espectador dos personagens, reforçar a ideia de coletividade da aldeia e em referência aos créditos de Cabra Marcado para Morrer (Eduardo Coutinho, 2012). No fundo musical, um cântico Pataxó que dialoga foneticamente com o nome do filme: "Êrkõn Pataxó", que significa "eu amo Pataxó".
 
CONSIDERAÇÕES
A produção de "Ê rtõ Pataxó - Minha Aldeia é a natureza" foi feita em Dezembro de 2017, período em que se completavam 1 ano e 7 meses de ocupação da comunidade Pataxó na Cachoeira do Iriri, em Paraty. Diante de um cenário de massacres e conflitos no Sul da Bahia, localidade em que os membros da aldeia estavam, a produção foi fundamental como registro audiovisual dos agentes de tempo e de espaço, quanto como experiência acadêmica e pessoal. Por meio do jornalismo, foi possível captar e revelar aspectos dessa realidade social cotidiana que não são alcançadas por formas de conhecimento mais prestigiadas em nossa cultura, ainda que os discursos jornalísticos sejam condicionados pelo modo particular como os profissionais vêem o mundo, a rotina e os objetivos das organizações onde atuam. (Meditsch, 1997, p.10). Através do audiovisual foi registrado um trecho da vida de uma pequena parte da sociedade, uma narrativa capaz de contribuir para a construção da História, preenchendo uma das lacunas deixadas pelos filtros sociais que a constroem (Paul Veyne, 1998). Cabe destacar a evolução técnica de direção ao longo da produção, notada na fotografia e edição do filme. Vale ressaltar, que as experiências e aprendizados conquistados ao longo do processo nos formam como profissionais de jornalismo, e também modificam o nosso olhar e o exercício de nossa cidadania.
 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁICAS
MEDINA, Cremilda. Entrevista: o diálogo possível. São Paulo: Ática, 2008.

PUCCINI Sérgio. Roteiro de Documentário: Da pré-produção à pós-produção. – 3ª ed. – Campinas, SP: Papirus, 2012. – (Coleção Campo Imagético)

PRITCHARD, Evans. Os Nuer: Uma descrição do modo de subsistência e das instituições políticas de um povo nilota - Oxford University Press, 1940. ਀㰀戀爀㸀㰀戀爀㸀䴀䄀䰀䤀一伀圀匀䬀䤀Ⰰ 䈀爀漀渀椀猀氀愀眀⸀ 嘀椀搀愀 攀 伀戀爀愀⸀ 匀漀 倀愀甀氀漀㨀 䄀戀爀椀氀 䌀甀氀琀甀爀愀氀Ⰰ ㄀㤀㜀㠀⸀㰀戀爀㸀㰀戀爀㸀嘀䔀夀一䔀Ⰰ 倀愀甀氀⸀ 䌀漀洀漀 猀攀 攀猀挀爀攀瘀攀 愀 栀椀猀琀爀椀愀Ⰰ 唀一䈀Ⰰ ㄀㤀㤀㠀⸀㰀戀爀㸀㰀戀爀㸀䤀䈀䜀䔀⸀ 伀猀 椀渀搀最攀渀愀猀 渀漀 䌀攀渀猀漀 䐀攀洀漀最爀昀椀挀漀 ㈀ ㄀ Ⰰ 搀椀猀瀀漀渀瘀攀氀 攀洀㨀 栀琀琀瀀猀㨀⼀⼀眀眀㈀⸀椀戀最攀⸀最漀瘀⸀戀爀⼀椀渀搀椀最攀渀愀猀⼀椀渀搀椀最攀渀愀开挀攀渀猀漀㈀ ㄀ ⸀瀀搀昀㰀戀爀㸀㰀戀爀㸀ऀ㰀⼀琀搀㸀㰀⼀琀爀㸀㰀⼀琀愀戀氀攀㸀㰀⼀戀漀搀礀㸀㰀⼀栀琀洀氀㸀